No último dia 16 de fevereiro deste ano, Tia Alice
deixou este mundo e foi para a casa do Pai Celestial. Ela que nasceu em 08 de
junho de 1912 em Itaporanga d’Ajuda e com oito anos veio residir em Estância,
pois, naquela época seus pais resolveram tentar dias melhores em outra
localidade. Em Estância aos quinze anos foi trabalhar na fábrica Santa Cruz e
de lá só saiu por questões de saúde no início dos anos cinqüenta do século
passado e logo foi aposentada por invalidez. Sendo a mais velha de quatros
irmãos, viu todos falecerem e também presenciou muitos fatos que aconteceram em
sua trajetória de vida terrena, não só em Estância, mas também no Brasil e no
mundo. Nunca casou e por isso não teve filhos. Por ela ser bastante religiosa
pertenceu a Pia União das Filhas de Maria, uma associação religiosa que com
passar dos anos desapareceu na paróquia de Nossa Senhora de Guadalupe.
Quando ela nasceu quem era o presidente
da província de Sergipe era o General José de Siqueira Menezes. O presidente da
república era o republicano Hermes
Rodrigues da Fonseca. Em Estância o grupo político era liderado pelo Coronel
Manuel Dantas. O Papa da época era Pio X e o Bispo de Sergipe era Dom José Thomaz Gomes da Silva, pois, a
Diocese de Aracaju abrangia todo território sergipano. Na freguesia de Estância
tinha como Vigário Monsenhor Vitorino Correa Fontes. Esse era o contexto político-social-religioso
de Estância. Em nível de Brasil começou um conflito armado conhecido como a Guerra do Contestado na região sul. Na
região nordeste, em Pernambuco, nascia o famoso Luiz Gonzaga e na Europa a
partir de 1914 surge à primeira Guerra Mundial e começam as aparições de Nossa
Senhora em Fátima.
A partir da década de 1920, começaram a surgir no
cenário nacional alguns fatores sociais e políticos que contribuíram
decisivamente para o declínio e o fim da República
Velha. O agravamento da crise econômica, a eclosão
de revoltas e começam os levantes militares: o Movimento Tenentista, a Revolta
dos 18 do Forte de Copacabana, a Revolução de 1924, a Coluna Prestes. O
crescimento das camadas sociais urbanas, além do acirramento dos conflitos
políticos devido à progressiva divisão das oligarquias dominantes formou o
conjunto de fatores que provocaram a Revolução de 1930. No final da década
de 20, Tia Alice começa a trabalhar na fábrica Sta Cruz. Todo que se passava no
Brasil ninguém tinha conhecimento como nos dias atuais, ou era por telegrama ou
por jornais que pouquíssimas pessoas liam, depois é que surge o rádio.
O rebuliço político continua no país e Getúlio
Vargas instala o estado Novo. Por outro lado, o operariado cresce
em número e em organização provocando o surgimento de sindicatos trabalhistas.
Os sindicatos lutam contra as longas jornadas de trabalho, os baixos salários, começa
a vigilância e repressão policial. Surgem as Leis Trabalhistas, o voto feminino
e secreto, começa o grande
desenvolvimento industrial da década de 1930. Entretanto, em 1939 começa outra
Guerra Mundial. Em
fevereiro de 1942, submarinos alemães iniciaram o torpedeamento de embarcações brasileiras no Oceano Atlântico e o Brasil vai à guerra. Período de tristeza e apreensão com os estancianos
convocados para guerra. Porém, Tia Alice, residindo em uma cidade do interior ficava
só observando o desenrolar dos acontecimentos, sendo radicalmente contra aos
comunistas, fascistas e nazistas.
No início da
década de 1950 começaram os problemas de saúde, se afastou do seu emprego e Getúlio suicida-se. Como leiga atuante da Igreja Católica participou ativamente
do movimento em prol da criação da Diocese de Estância. Mesmo não sendo uma
pessoa culta, mas ajudava nos trabalhos de catequese até quando a idade o permitiu.
Quando aconteceu um tiroteio em Estância entre o grupo da Prefeita Núbia Macedo
e a oposição, Tia Alice estava chegando à Matriz e rapidamente procurou se
proteger indo para a lateral superior da Igreja. Foi participante de grandes solenidades
religiosas: festas de Natal e Ano Bom, Nossa Sra de Guadalupe, Santa Cruz, Sr
do Bonfim, Nossa Senhora da Ajuda em sua cidade Natal, Senhor dos Passos em São
Cristovão, Divina Pastora e tantas outras. Entretanto, nunca acreditou que o
homem foi a Lua e tão pouco se interessou pela ditadura militar, pois, a mesma
nunca afetou no seu cotidiano. Porém, vibrava com as conquistas do time do
Santa Cruz.
Diante de sua
pequenez e por “não se ligar” em assuntos políticos, mas sempre manteve uma
admiração especial pelos primeiros proprietários da fábrica Santa Cruz e outros
personagens como Getúlio Vargas, Senador Julio Leite, Monsenhor Santiago e Dom
José B. Coutinho. Assim foi Tia Alice que nos deixou com seus 102 anos de muita
simplicidade que no dia de seu centenário disse que queria viver mais cem anos.
Com bastante fé e devoção, diariamente rezava o Rosário, sempre estava com o
terço nas mãos recitando e cantarolando hinos religiosos. Descanse em paz!